Chef Will Peters explica como memória, afeto e tradição moldam nosso paladar durante as festas de final de ano

 

Dezembro chega carregado de rituais, encontros e despedidas. É o mês em que as pessoas revisitam lembranças, encerram ciclos e buscam, no aconchego da comida, uma forma de conexão e segurança. Esse movimento tem nome: gastronomia afetiva, uma tendência que ganha força a cada fim de ano e explica por que pratos simples, caseiros e cheios de história ganham o protagonismo na mesa de festas. Nesse contexto, o chef Will Peters, do Saza Cozinha, de Curitiba (PR), afirma que a comida é uma das formas mais potentes de comunicação humana. “A gastronomia afetiva é uma ponte entre o que somos e o que lembramos. Não é sobre complexidade técnica, mas sobre o poder de um cheiro ou sabor de nos transportar para momentos seguros e familiares”, explica

 

Natal e Réveillon são cheios de símbolos e tradições. Muitos pratos das festas remetem diretamente a histórias vividas com avós, pais, amigos ou a infância, mesmo que não tenham sido perfeitos, são familiarmente reconfortantes. O aroma da rabanada que remete às manhãs de dezembro da infância. O molho do peru que lembra os encontros de família. A farofa, sempre presente, une sabores e memórias num único prato. “Nosso cérebro registra cheiros e sabores de forma profunda. Em dezembro, tudo parece mais intenso, por isso buscamos refeições que nos abracem”, diz Peters.

 

Ainda de acordo com o chef, não é apenas tradição, existe explicação emocional e até bioquímica. Dezembro é emocionalmente carregado – Encerramento de ciclo, expectativas para o novo ano, lembranças de pessoas que já não estão presentes. A comida serve como um “porto seguro”. O clima de coletividade aumenta o desejo de compartilhamento — Sentar-se à mesa reforça laços e cria sensação de pertencimento — algo que o ser humano procura naturalmente nessa época. Texturas quentes e aromas intensos ativam sensação de aconchego – Canela, baunilha, manteiga, frutas secas, caramelização. São ingredientes que estimulam neurotransmissores ligados ao prazer e à memória.

 

Clássicos afetivos que dominam dezembro no Brasil

 

Segundo Will Peters, os pratos afetivos têm pontos em comum: são simples, cheios de textura e cheiros marcantes.

 

Rabanada

Arroz doce

Peru com molho caseiro

Massas cremosas

Assados de longa cocção

Sobremesas com especiarias

Bolos tradicionais

 

“A comida afetiva não precisa ser ‘bonita’. Ela precisa ser sincera, ter sabor de casa e aquele toque imperfeito que só a cozinha da memória entrega”, ressalta o chef. Além disso, o profissional compartilha algumas dicas práticas para reavivar a gastronomia emocional:

 

Resgate receitas da família — mesmo que adaptadas para o seu estilo atual.

Valorize especiarias típicas do mês — canela, noz-moscada, cravo e gengibre.

Crie rituais culinários — montar a mesa, cozinhar junto, dividir tarefas.

Aposte em texturas reconfortantes — cremoso, crocante, quentinho.

Inclua um prato que conte uma história — da sua avó, de viagens ou de uma lembrança feliz.

 

Para Will Peters, a gastronomia afetiva não é apenas uma tendência, mas uma necessidade humana, especialmente nessa época. “Quando cozinhamos para alguém, entregamos mais do que um prato: entregamos cuidado. É por isso que a comida de fim de ano tem esse poder único de nos reunir, nos fortalecer e nos lembrar quem somos”, conclui o chef.