
Autor levou o público às lágrimas ao compartilhar sua história marcada por violência, traumas e como a fé e a família foram essenciais para quebrar ciclos e transformar dores em projetos sociais
O silêncio tomou conta do Palco Apoteose na Bienal do Livro do Rio na tarde deste domingo. Não por falta de palavras, mas pela força delas. O escritor Junior Rostirola emocionou centenas de pessoas ao compartilhar, sem filtros, uma história marcada por dor, traumas e superação.
Com a voz embargada, relembrou sua infância marcada pelo alcoolismo do pai, agressões físicas e psicológicas, perdas familiares devastadoras e episódios de bullying que o levaram a abandonar a escola aos 13 anos. “Meu avô era imigrante italiano, alcoólatra e extremamente violento com a minha avó. Ele queimava as pernas dela. Ela faleceu aos 26 anos, em decorrência da violência sofrida durante o casamento”, revelou, arrancando lágrimas da plateia.
A dor atravessou gerações na família de Junior. Seu pai ficou órfão aos 9 anos e, sem qualquer referência de afeto ou proteção, cresceu reproduzindo os mesmos padrões de violência. “Ele se tornou um homem extremamente agressivo. A violência dele desfigurava minha mãe”, contou o autor.
Sua mãe viveu um histórico devastador de perdas. “Minha mãe apanhou grávida. Um bebê nasceu prematuro e morreu. O segundo filho resistiu por oito meses, ficou internado, recebeu alta e morreu dias depois. A terceira gravidez foi minha irmã Rosana, que ficou no hospital por nove meses, mas também não resistiu”, relatou, visivelmente emocionado.
Entre abusos, surras e episódios constantes de violência doméstica — com a polícia sendo presença frequente em sua casa —, Junior cresceu se sentindo rejeitado, invisível e deslocado. “Cheguei ao ponto de tentar arrancar meus próprios olhos. Acreditava que meu pai não me amava porque eu tinha os olhos claros, como os da minha mãe. Na minha cabeça de criança, se meus olhos fossem diferentes, talvez eu fosse aceito, talvez eu fosse amado. Eu não entendia por que não recebia amor”, relembrou, emocionando a plateia.
A virada na vida veio aos 13 anos, quando uma vizinha o convidou para ir à igreja. “Eles cantavam uma canção que dizia: ‘Para te adorar foi que eu nasci. Meu prazer é te louvar. Meu prazer é estar na casa de amor.’ E aquilo foi um bálsamo para mim. Porque até aquele momento, eu não sabia o que era ter uma casa, muito menos amor.”
Foi ali que, segundo ele, começou seu processo de cura. Um caminho longo e doloroso, que se estendeu até os 22 anos. “Deus me falou quem eu era, quem eu não era e quem eu iria me tornar”, disse. “Meu pai foi tão vítima quanto eu. A diferença é que eu tive um encontro com Deus e pude quebrar essa maldição.”
A jornada de superação também teve um pilar fundamental: a esposa Michele, com quem está casado há 23 anos e que esteve ao seu lado durante a palestra. “Eu perguntei para ela: ‘O que você viu em mim? Eu era muito esquisito.’ E ela respondeu: ‘Eu vi um homem de Deus.’”
Michele, que também participa da Bienal com os livros “Autêntica” e “21 Chaves para uma Vida Autêntica”, compartilha com Júnior uma história de fé, resiliência e autenticidade. Ela mesma enfrentou 27 cirurgias ao longo da vida. “Se a cura vier ou não, precisamos entender que vivemos em um mundo de aparências, mas o que realmente importa é a essência”, declarou.
Das feridas, nasceram propósitos
Na palestra, Júnior destacou que decidiu transformar toda dor em missão. “Pessoas feridas ferem. Mas pessoas curadas curam. Todas as minhas feridas se transformaram em projetos sociais, que são, na verdade, curas para as minhas próprias feridas”, afirmou.
Essa decisão deu origem à Associação Escolhi Amar, que hoje mantém diversos projetos sociais no Brasil e no exterior, levando acolhimento, dignidade e esperança para quem mais precisa. Entre as ações estão:
Lar da Criança Feliz, que acolhe crianças de 0 a 12 anos em situação de vulnerabilidade;
Lar do Adolescente, que oferece abrigo e suporte a jovens de 12 a 18 anos;
Centro de Recuperação Feminino Conviver, que acolhe mulheres dependentes químicas e portadoras do vírus HIV/AIDS, oferecendo tratamento, acolhimento e reinserção social;
Mercado Solidário, onde famílias em situação de vulnerabilidade podem adquirir alimentos a preços simbólicos, preservando sua dignidade e direito de escolha — uma iniciativa que já distribuiu centenas de toneladas de alimentos;
Projetos esportivos, que oferecem acesso gratuito a diversas modalidades, criando oportunidades para crianças e jovens que, assim como ele no passado, muitas vezes se sentem excluídos;
Atendimentos psicológicos gratuitos para pessoas de baixa renda, além de visitas regulares a presídios, levando apoio emocional e espiritual aos encarcerados;
E a Missão Haiti, que abraça uma nação inteira. Além de fornecer alimentação física e espiritual, a missão mantém uma escola construída em um terreno próprio, que hoje garante acesso à educação para mais de 200 crianças haitianas.
“Você opera por quem você é, não pelas circunstâncias”, reforçou o autor, sendo ovacionado.
Autor de best-sellers e incansável missionário
De um menino que abandonou a escola aos 13 anos, Júnior se tornou hoje um autor de sete livros, incluindo o best-seller “Café com Deus Pai”, referência quando o assunto é fé, superação e transformação de vidas.
Além da palestra emocionante, ele participa da Bienal do Livro do Rio autografando todos os seus livros — entre eles os lançamentos e relançamentos como “Encontrei um Pai” (com nova capa), “30 Dias – Corpo, Alma e Espírito”, “Os Desafios de Júnior” (para o público pré-adolescente de 9 a 13 anos), “Expressinho” (para crianças até 8 anos) e “Entre Cores”, um livro interativo de colorir, pensado para momentos em família e para aliviar o estresse.
“Deus me deu uma família linda, uma esposa maravilhosa e um propósito. Aquele menino que abandonou a escola aos 13 anos, quis Deus que se tornasse autor de best-sellers e agente de transformação na vida de muitas pessoas”, declarou.