
Primeira individual do artista português na galeria terá uma imensa obra ‘site-specific’, composta por conjuntos escultóricos ocupando todo o espaço expositivo e visível pelo lado externo
A Gomide&Co tem o prazer de apresentar Fogo Fumo, primeira individual de Tiago Mestre (Portugal, 1978) na galeria. A abertura será no dia 07 de junho (sábado), às 15h, e a exposição segue em cartaz até 09 de agosto. O texto crítico é assinado por Verônica Stigger.
A exposição consiste em uma grande instalação site-specific, composta por diferentes conjuntos escultóricos, que ocupa todo o espaço expositivo. Apresentando grupos inéditos de esculturas em cerâmica, a mostra funciona como uma síntese de aspectos fundamentais da produção do artista, além de aprofundar investigações que têm estado bastante presentes em seu trabalho há alguns anos.
Para receber a proposta instalativa de Tiago Mestre, a galeria passou por uma alteração importante em seu espaço expositivo, removendo a parede da fachada que bloqueava a visão entre interior e exterior. Com essa mudança, a exposição passa a funcionar como uma espécie de vitrine na qual as peças em exibição estabelecem um diálogo com a própria cidade.
Para Fogo Fumo, Mestre parte de uma reflexão sobre a tradição da cerâmica portuguesa, com particular atenção para a longa tradição da olaria do Alentejo, onde nasceu e cresceu, propondo uma reelaboração que coloca em perspectiva aspectos históricos, sociais e culturais dos objetos. Assunto ao qual dedica especial atenção mesmo antes de ter começado a trabalhar com escultura em cerâmica, o processo de revisão da produção tradicional da olaria do Alentejo surgiu na trajetória do artista como um ponto de conexão entre sua origem e a noção de espaço advinda da arquitetura, sua primeira formação.
Na exposição, Mestre trata de objetos que não estão mais numa condição estável, apresentando-se como vestígios de um ciclo interrompido no tempo. Uma viga de aço própria da construção civil atravessa o espaço expositivo e funciona como um eixo em torno do qual se organizam diferentes esculturas em cerâmica baseadas em peças utilitárias oriundas no universo da olaria popular de Portugal. As tipologias apresentadas pelo artista inspiram-se num vasto repertório de elementos utilitários populares, como cântaros, jarros, bilhas, ânforas, tigelas, copos e canecas, associados aos antigos espaços de convivência e consumo de álcool e tabaco, como a tasca, a adega e a venda. No entanto, Mestre interfere nas formas originais desses elementos, criando deformações que remetem à condição de embriaguez provocada pelo consumo das substâncias que tais utensílios costumam conter. Tal intervenção promove o deslocamento desses objetos de seu contexto cotidiano e utilitário para o universo da arte contemporânea, demarcando ao mesmo tempo indícios que remetem ao seu uso em determinada época e lugar.
Em articulação com esse conjunto de obras, a exposição apresenta também esculturas de cachimbos que remetem aos cachimbos de cerâmica branca produzidos em Londres entre meados dos séculos 16 e 19, com reminiscências até os dias de hoje e disseminados em outros centros urbanos na Europa. Mas os cachimbos de Mestre, por sua vez, apresentam uma configuração sinuosa, contorcida, que remete ao caráter volátil da própria fumaça. As fumaças também estão presentes na exposição, numa configuração não mais atmosférica, mas sim rochosa, quase que como um elemento fóssil. “Se, numa observação mais detida, percebe-se que esse conjunto de obras não constitui uma paisagem, permanece, no entanto, a sensação de caverna e de pré-história,” comenta Stigger em seu texto para a exposição.
A produção de Tiago Mestre é marcada por atravessamentos em diversos campos que se entrecruzam. Originário de Beja, cidade na região do Alentejo, sul de Portugal, o artista mudou-se para o Brasil em 2010, estabelecendo-se em São Paulo. O período coincidiu com sua passagem do meio da arquitetura, sua primeira formação, para as artes visuais – inicialmente com ênfase na pintura, passando em seguida a trabalhar também com escultura e instalação. De modo que sua prática artística é bastante marcada por uma noção de deslocamento tanto territorial quanto disciplinar que embasa sua maneira de lidar com as linguagens que compõem sua produção. Na obra de Mestre, pintura, escultura e instalação acontecem em constante diálogo entre si, superando as fronteiras disciplinares entre os meios. A pintura espelha a experiência escultórica, assim como o elemento escultórico apresenta muitas vezes inserções pictóricas.
E um dos principais pontos de partida para pensar uma obra ou exposição é a noção de dispositivo instalativo, ou seja, o trabalho entendido como uma composição sensível que se coloca de maneira crítica no espaço.
Sobre Tiago Mestre
Tiago Mestre (Portugal, 1978) é graduado em Arquitetura pela Faculdade de Arquitetura de Lisboa (2001) e integrou o Programa Independente de Estudos de Artes Visuais da MAUMAUS (2008) e o Curso Avançado em Pintura da Ar.co (2009), ambos também em Lisboa, Portugal. Em 2016, tornou-se Mestre em Arquitetura pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAUUSP, 2016). Desenvolve seu trabalho entre a pintura, a escultura e a instalação, meios através dos quais explora sua formação inicial em arquitetura incorporada às linguagens da arte contemporânea. Sua poética é permeada pela edição da obra nos espaços de apresentação, que muitas vezes assumem contornos de sua prática de ateliê. Entre suas mostras recentes, destacam-se as individuais Realismo, realizada em Uma Certa Falta de Coerência (Porto, 2024); Feu, na ZSenne ArtLab (Bruxelas, 2024); Sun, sun, sun e Empire, na LAMB Gallery (Londres, 2023 e 2022 respectivamente), Smoke Gets in Your Eyes, na Kupfer Projects (Londres, 2019) e Noite. Inextinguível, inexprimível noite, na Galeria Millan (São Paulo, 2017). Entre coletivas recentes, destacam-se Still Life, Still Living, no Olhão (São Paulo, 2024), Pequenas pinturas, no auroras, Uma mão lava a outra, no Olhão (São Paulo, 2022) e Jardim das delícias. Juízo final, na Galeria Cavalo (Rio de Janeiro, 2018).
Abertura: 07 de junho, às 15h
Período expositivo: 07 de junho a 09 de agosto de 2025
Horários de visitação: segunda a sexta-feira, das 10h às 19h | sábado, das 11h às 17h
Entrada gratuita
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