
A paixão pela gastronomia move chefs ao redor do mundo, mas a pressão constante e o desgaste emocional têm um preço alto
No imaginário popular, a cozinha profissional é um lugar de aromas sedutores, onde a paixão pela gastronomia se traduz em pratos impecáveis. No entanto, por trás das portas basculantes dos restaurantes, a realidade é bem diferente: um ambiente de pressão intensa, jornadas extenuantes e uma cultura de cobrança que pode comprometer a saúde mental de seus profissionais.
Henrique Campos, chef e proprietário do Figurate Italian Food, conhece bem essa realidade. Com mais de uma década de experiência na área, ele reflete sobre a relação entre o universo gastronômico e a saúde mental dos cozinheiros. “Não diria que é um tema discutido abertamente, mas nos últimos anos começou a ser abordado. Ainda estamos longe do ideal, mas é um início importante”, afirma.
Um fardo silencioso
A pressão do tempo, a exigência de perfeição e a falta de uma cultura de acolhimento são alguns dos fatores que contribuem para o adoecimento mental dentro das cozinhas. “A gente está sempre lutando contra o tempo, seja para preparar a mise en place corretamente, entregar o prato no momento exato ou cozinhar no ponto certo. E ainda tem a pressão da percepção do cliente”, pontua Henrique.
O problema não está apenas nas altas demandas diárias, mas também no impacto a longo prazo: jornadas exaustivas, poucos dias de folga e praticamente nenhuma interação social além do trabalho.
Abrir o próprio restaurante é um sonho para muitos chefs, mas pode se tornar um novo fator de estresse. “Além de tudo, ainda tem a pressão financeira. O restaurante precisa dar retorno, as contas precisam ser pagas. E a situação fica ainda mais complicada quando o investidor não é da gastronomia”, explica Henrique. A cobrança constante pode ampliar o desgaste mental, tornando a paixão pela culinária uma fonte de angústia.
Fomentar a saúde mental no meio gastronômico é essencial para garantir o bem-estar dos profissionais. Henrique defende a terapia como uma ferramenta fundamental e compartilha sua própria experiência. “Tenho transtorno de ansiedade, como muitos cozinheiros. Mas tenho certeza de que poderia ser algo muito pior se eu não fizesse terapia há mais de oito anos.”
Entre as ações práticas, Henrique sugere medidas simples que podem fazer diferença: organizar escalas mais equilibradas, criar espaços para descanso e incentivar atividades físicas e terapêuticas. “O restaurante precisa funcionar, mas também precisa cuidar de quem faz ele acontecer”.
Sobre o Figurate
O Figurate é uma pizzaria autoral fundada em 2018 pelo chef Henrique Campos, em Curitiba (PR). Inspirado na tradição do street food italiano, ele aposta em massas de fermentação natural, produtos locais e uma abordagem artesanal e contemporânea. Mais informações em www.figurate.com.br.